domingo, 28 de abril de 2013

Incentivos ao setor sucroalcooleiro

As dificuldades dos produtores do setor sucroenergético e as medidas de incentivo do governo anunciadas semana passada repercutiram na mídia especializada, mas também na grande mídia, incluindo a televisão. Os veículos noticiaram a reunião da presidente Dilma com empresários do setor e o pacote de medidas anunciado pelo Ministro da Fazenda Guido Mantega. Em resumo, as medidas do governo são:
  • queda nos juros de financiamentos referentes ao ProRenova para o valor máximo de 5,5%; 
  • programa de financiamento para estocagem;
  • zero de imposto PIS/Cofins (Programa de Integração Social/Contribuição Social para o Financiamento da Seguridade Social), tanto na produção quanto na distribuição.
Elenco aqui algumas matérias sobre o assunto, que já pelo título indicam pontos positivos e negativos associados às novas medidas, bem como a ausência de uma relação direta entre os incentivos e reduções do preço do etanol nos postos de combustível.

Jornal Cana / ProCana BrasilDilma anuncia pacote para recuperar etanol brasileiro (23/04/2013);
Nova CanaAs opiniões do governo e da indústria sobre o pacote para o etanol (24/04/2013);
Site da União da Indústria de Cana-de-Açúcar (UNICA): UNICA vê pontos positivos em decisões anunciadas pelo governo, e ressalta importância de busca permanente por medidas de longo prazo (23/04/2013);
Valor EconômicoMedidas do governo incentivam investimento (25/4/2013);
Folha OnlineDilma propõe hoje pacote de incentivos para setor de etanol (22/04/2013); Governo vai reduzir tributo para baratear etanol e forçar queda da gasolina (22/04/2013); Governo zera tributo do etanol, aumenta mistura na gasolina e reduz juro do produtor (23/04/2013); Pacote para setor de etanol não garante redução no preço, diz Dilma (23/04/2013); Análise: Investimentos só retornam com plano de longo prazo para etanol (24/04/2013); Diretor da Unica defende retomada de tributo federal para gasolina (24/04/2013); Leitores criticam incentivos do governo a produtores de etanol (25/04/2013);
Estadão.com.br: Incentivo ao setor sucroalcooleiro (23/04/2013); Incentivo ao etanol (23/04/2013); Competitividade do etanol no longo prazo (24/04/2013); Planejamento de longo prazo é a principal aposta da cadeia do Etanol para o fortalecimento do setor (24/04/2013); Estímulo ao etanol foi insuficiente (24/04/2013); Diretor da Unica defende retomada da Cide para gasolina (24/04/2013); Aníbal cobra incentivo à energia a partir da cana (24/04/2013); Dilma não garante etanol mais barato (24/04/2013); Ajuda tardia e insuficiente (26/04/2013).

O que se observa a partir das notícias é que o setor recebeu incentivos que aliviam as pressões sobre os custos, mas que há ainda incerteza sobre os efeitos do novo pacote sobre os investimentos e sobre os preços dos combustíveis aos consumidores. Satisfeita mesmo com as novas medidas talvez esteja a Petrobras, que tem sido forçada a importar gasolina a preços acima de seu valor de venda e utiliza etanol anidro misturado à gasolina em proporção que aumentará, a partir de 1º de maio, de 20% para 25%.

segunda-feira, 22 de abril de 2013

Etanol x Gasolina: um caso de política?

A reportagem de Felipe Cordeiro para o Informa Economics FNP, intitulada "Sem conseguir competir com a gasolina, etanol clama por políticas públicas" e veiculada pela União dos Produtores de Bioenergia em 9 de abril, mostra o embate sobre a sustentabilidade econômica do bioetanol frente à gasolina. Os atores e seus posicionamentos podem ser resumidos assim:

Os que argumentam que faltam políticas públicas para o bioetanol no Brasil
Márcio Perin, analista de açúcar e energia da Informa Economics FNP: o biocombustível vive uma "crise de rentabilidade", os investimentos são insuficientes.
Roberto Rodrigues, coordenador do Centro de Agronegócios da Fundação Getúlio Vargas (FGV) e ex-ministro da Agricultura de 2003 a 2006: "Quem vai investir em um negócio se não sabe se vai dar retorno amanhã?". "Não existe política pública para o biocombustível". "São fundamentais a regulamentação da paridade da gasolina com o etanol e tributação e preços adequados".
Ismael Perina Júnior, presidente da Organização dos Plantadores de Cana da Região Centro-Sul do Brasil (Orplana): "O preço da cana é formado pelas cotações do açúcar e do etanol. Se considerar apenas os valores do hidratado [utilizado como combustível], há anos a produção dá prejuízo".
Elizabeth Farina, presidente da União da Indústria de Cana-de-Açúcar (Unica): não é possível desvincular o mercado do etanol do da gasolina e o atual cenário internacional favorece o combustível fóssil. "As externalidades do petróleo são negativas, e as nossas, positivas. Hoje, a gasolina é mais barata e ficará ainda mais por causa das novas fontes que serão exploradas". As políticas públicas para o etanol devem criar instrumentos que reconheçam que o biocombustível "gera benefícios líquidos para a sociedade", enquanto o seu concorrente, "custos de meio ambiente e saúde".
Maurilio Biagi Filho, presidente do Grupo Maubisa: a iniciativa deve partir dos produtores de etanol. "Enquanto ele achar que é um `coitadinho´, vai ficar sempre essa conversa de que o governo precisa fazer. O setor que tem que agir, elaborar uma legislação que seja factível e apresentar ao poder público", apontou, recordando-se do Programa Nacional do Álcool (Proálcool), criado em 1975, do qual foi um dos líderes. Defende uma postura que valorize os benefícios do etanol e evidencie as desvantagens da gasolina. "No mundo inteiro, o combustível fóssil poluente é sobretaxado". O etanol anidro, quando misturado à gasolina, melhora a octanagem desta e a torna menos poluente, reduzindo a emissão de gases tóxicos. "O álcool é um combustível mais nobre do que a gasolina, mas, hoje, só é usado se custar menos de 70% do valor do derivado do petróleo. Nesse ritmo, caminha para virar apenas um aditivo".
 Os que argumentam que não faltam políticas públicas para o bioetanol no Brasil
Luís Eduardo Duque Dutra, assessor da Diretoria Geral da Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP): discorda de que as políticas públicas para a produção de etanol sejam inexistentes ou deficitárias. "Desde que a regulamentação do etanol passou para a ANP, em 2011, a entidade garante previsibilidade ao setor e estabelece uma ponte na entressafra, de modo que não haja desabastecimento no Brasil". As dificuldades encontradas pelo setor ocorrem devido a fatores de mercado, que o fazem incapaz de competir com a gasolina. "O primeiro ponto é que entre uma safra e outra do biocombustível existe a entressafra. O petróleo não enfrenta esse problema". "O segundo se relaciona à escala industrial. A maior usina de álcool é projetada para produzir 30 mil barris de gasolina equivalente, enquanto as refinarias são construídas com capacidade de, no mínimo, 100 mil barris", continuou o assessor da ANP. "E a terceira questão é que a tendência do preço da gasolina não é de elevação no mercado internacional. Em 2009, o barril estava a US$ 140. Hoje, está entre US$ 90 e US$ 110". 

E o jornal Folha de S. Paulo noticiou que a presidente Dilma Rousseff reunirá hoje o setor sucroalcooleiro para anunciar os detalhes de um Regime Especial de Incentivos para o Desenvolvimento da Infraestrutura Sucroalcooleira visando a estimular investimentos dos produtores no etanol, aumentar a oferta (e assim baixar o preço) do biocombustível e resgatar sua competitividade em relação à gasolina. São financiamentos ao produtor preparados pelo Ministério da Fazenda, reduções de juros em empréstimos e redução da carga tributária para o setor (o Executivo quer praticamente zerar a cobrança de PIS/Cofins sobre o combustível, hoje equivalente a R$ 0,12 por litro de etanol - ou R$ 48,00 por metro cúbico).

Segundo a notícia, "representantes do setor afirmam que a desoneração, por si só, não resolve o problema da rentabilidade, agravado nos últimos anos. Além de uma política eficiente de crédito, eles esperam que haja ganhos com o aumento da mistura do álcool à gasolina, de 20% para 25%, que entra em vigor em maio".

O aumento da oferta de etanol poderá também levar à redução da importação de gasolina, diz a notícia, beneficiando a Petrobras, que atualmente importa gasolina para atender o mercado. "No primeiro trimestre, o país importou 50 mil barris de gasolina, segundo a empresa. Como os preços no país não variam com a cotação internacional, a Petrobras tem prejuízo com as importações de derivados acima do preço de revenda no mercado interno."

Logo mais saberemos como foi a reunião e quais medidas serão implementadas. Será que os produtores de etanol, a Petrobras e os consumidores de combustíveis ficarão satisfeitos?

sábado, 13 de abril de 2013

Primeira variedade transgênica

O Canal Rural anunciou no dia 3 de abril que a primeira variedade de cana-de-açúcar transgênica deverá ser lançada no mercado em 2017-2018. A coordenadora de biotecnologia do CTC, Sabrina Chabregasa,  informa que são necessários pelo menos 5 ou 6 anos para o desenvolvimento de uma nova variedade. É o caso da inclusão de características mais simples, como a resistência a insetos, que ocorre por meio da introdução de um gene. Para características mais complexas, levam-se cerca de 8 anos de pesquisas e testes até que a nova variedade seja comercializada.

A cana transgênica promete gerar aumentos de produtividade e dos teores de sacarose da cana, além de resistir a condições climáticas adversas, como a seca e o excesso de chuvas em algumas regiões,  e ao ataque de pragas. Países como Brasil (que é o maior produtor mundial de cana), Indonésia, Argentina e China estão na corrida para lançar a primeira variedade de cana-de-açúcar transgênica.

Diante da necessidade de incremento na produção, o mercado pressiona os pesquisadores. No CTC, onde trabalham cerca de cinquenta pessoas ligadas diretamente à pesquisa, os acionistas são o próprio mercado produtor de cana-de-açúcar, que tem pressa para lançar novidades. Os estudos são regulados pela Comissão Técnica Nacional de Biossegurança, a CTNBio, e os trabalhos são todos submetidos a aprovação antes de chegar ao mercado.

Essa inovação favorecerá o bioetanol de cana-de-açúcar no que tange ao aspecto econômico, pois deverá levar ao aumento da produtividade. Minha dúvida é sobre o aspecto ambiental. Que impactos ambientais (positivos ou negativos) a cana transgênica traria? Quais análises têm sido feitas para identificar e mensurar esses impactos? Haveria também impactos sociais?

Assista ao vídeo da reportagem:


sexta-feira, 12 de abril de 2013

Patente verde pela sustentabilidade

A Revista da Propriedade Industrial (RPI) publicou em 12 de março o deferimento da patente de um processo de tratamento de resíduos sólidos para geração de energia elétrica baseado na pirólise, que reduz o impacto ambiental se comparado aos processos de combustão e incineração. A pirólise produz gases, como o metano e o hidrogênio, que podem ser encaminhados para um combustor ligado a um gerador, para a produção de energia elétrica. Essa técnica pode ser empregada para resíduos da cana-de-açúcar.

Segundo matéria veiculada pelo DCI, esse tempo de apenas nove meses depois do pedido foi recorde e justifica-se pelo ingresso da invenção no programa Patentes Verdes, que foi criado pelo Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI) em abril de 2012 com o principal propósito de incentivar a inovação sustentável. Com o novo programa, o tempo de exame das solicitações de patente de invenção nas categorias Energias Alternativas, Conservação de Energia, Gerenciamento de Resíduo, Agricultura e Transporte caiu de 10 para dois anos, no máximo.

A notícia, reproduzida no site Protec, informa que no exterior tem se formado um consenso sobre a importância de novas tecnologias no combate às mudanças climáticas globais: "o governo de Japão, Israel, Estados Unidos, Reino Unido, Canadá, Austrália e Coreia do Sul criou programas-piloto para acelerar o exame de pedidos de patente direcionados a tecnologias verdes".

Com o exame dessas patentes acelerado, os inventores terão mais um estímulo para realizar esse tipo de inovação e lançar novas técnicas e produtos no mercado. No caso da patente citada, prevê-se a redução de resíduos e a geração de energia elétrica.

Saiba mais sobre o Patentes Verdes aqui.

terça-feira, 9 de abril de 2013

Espectrometria de massas para biocombustíveis

O método de espectrometria de massas tem auxiliado pesquisas da Embrapa em biocombustíveis, com resultados promissores. É o que informa notícia publicada hoje pela empresa. A matéria destaca que, "nos trabalhos com etanol, os pesquisadores utilizarão a espectrometria de massas para desenvolver metodologias ultrarrápidas e com menor geração de resíduos para caracterizar duas matérias-primas promissoras para produção do combustível a partir de celulose e hemicelulose: o bagaço de cana e o capim-elefante".

A matéria informa que a Embrapa Agroenergia utiliza a espectrometria de massas em sua Central de Análises Químicas e Instrumentais para realizar pesquisas em metabolômica, utilizada para estudo dos produtos do metabolismo de um organismo. Em um dos projetos de pesquisa da empresa, os cientistas a utilizam para identificar as substâncias geradas pelas leveduras durante a produção do etanol a partir de diferentes tipos de açúcares. "Os pesquisadores utilizarão os dados obtidos para definir alvos de melhoramento genético dos microrganismos, de modo a empregá-los de forma eficiente na produção de etanol celulósico (também chamado de segunda geração ou 2G)".

Em março, pesquisadores da Embrapa foram à Alemanha para participar de treinamentos na empresa Bruker – fabricante de equipamentos – e realizar visitas técnicas a unidades do Max Planck Institute, na cidade de Bremen. Eles receberam treinamentos para utilização de equipamento e discutiram metodologias que podem ser aplicadas às pesquisas conduzidas na Embrapa Agroenergia, além da utilização de softwares para processamento de dados. Os recursos da bioinformática permitem analisar e processar muitos dados, como os gerados em estudos focados em metabolômica, que aplicam a espectrometria de massas em amostras com elevado número de compostos.

Os espectrômetros de massas conseguem identificar, caracterizar e quantificar grande variedade de compostos químicos presentes em diferentes materiais. "A principal vantagem da espectrometria de massas é o fato de ser mais sensível e seletiva do que outros métodos. Além disso, não exige grandes quantidades de amostras, podendo trabalhar até com concentrações menores do que as nanomolares. Dessa forma, é mais amigável ambientalmente, já que utiliza menos solventes e reagentes, gerando menos resíduos".

O emprego de espectrômetros de massas, metodologias de pesquisa avançadas e softwares de processamento de dados deverá resultar em maior eficiência na produção de etanol de segunda geração, favorecendo o biocombustível em termos econômicos, e redução do lançamento de resíduos no ambiente, com efeitos positivos do ponto de vista ambiental.

segunda-feira, 8 de abril de 2013

Tecnologia para aumentar a produtividade de processos industriais

A Agência Fapesp publicou hoje matéria sobre uma tecnologia desenvolvida por pesquisadores brasileiros da empresa I.Systems para aumentar a eficiência de linhas de produção em grandes indústrias, com base na lógica Fuzzy. O desenvolvimento, que contou com apoio do Programa FAPESP Pesquisa Inovativa em Pequena Empresa (PIPE), resultou no software Leaf e já está sendo empregado em empresas como Coca Cola, Rhodia e Ajinomoto.

O Leaf roda no sistema operacional Windows, coleta informações muito simples de um processo industrial – classificadas em três níveis: mínimo, médio e máximo – e gera instantaneamente todas as correlações entre essas variáveis. Assim, aumenta a estabilidade dos processos, diminui os custos e melhora a produtividade.

Destaco aqui o emprego dessa tecnologia nas usinas de produção de açúcar e bioenergia Tonon, São Martinho e Pederneiras.
Nas usinas de produção de açúcar e de bioenergia, o sistema é utilizado para estabilizar melhor a geração de vapor das caldeiras. Ao integrar essa função com a geração de energia, é possível que a usina passe a gerar mais energia com a mesma quantidade de biomassa que utilizava anteriormente. 
“Como o software executa o controle multivariável do processo, ele consegue ter uma informação mais global do estado da caldeira, por exemplo, e controlar a geração de energia”, explicou Santiago [Igor Bittencourt Santiago, presidente da I.Systems].
Segundo a reportagem, a I.Systems está avaliando se solicitará a patente da tecnologia no Brasil ou no exterior, ou se trabalhará com segredo industrial nos mercados norte-americano, asiático e europeu. A empresa foi contemplada com o primeiro aporte de investimento do fundo Pitanga de venture capital (capital de risco), criado por fundadores da Natura e do Itaú Unibanco e administrado pelo biólogo Fernando Reinach, ex-diretor da Votorantim Novos Negócios.

Com o aumento da produtividade e da eficiência das usinas, ganha força o argumento favorável ao bioetanol, no que tange o aspecto econômico da controvérsia. Mas seria preciso generalizar o uso dessa tecnologia, que no momento está sendo empregada em  apenas três usinas.

Matriz energética em pauta no Globo Ecologia

Em 23 de junho de 2012, o programa Globo Ecologia, exibido pela Rede Globo, discutiu a matriz energética brasileira. No trecho a seguir, o foco é a geração de bioeletricidade e etanol. O professor Luis Augusto Barbosa Cortez, da Faculdade de Engenharia Agrícola da Unicamp, e o gerente de planejamento da Pedra Agroindustrial S.A., Matheus Biagi Carvalho, são os especialistas entrevistados. Moradores de Sertãozinho também dão depoimentos.


Os combustíveis fósseis são apontados como opção insustentável, e as queimadas, aliadas ao agronegócio, como principais responsáveis pelo agravamento do efeito estufa. A falta de políticas de longo prazo de construção de uma matriz energética limpa no futuro é destacada por Cortez. A usina de Buriti (SP) aparece como exemplo de bom aproveitamento da cana.

O programa mostra ainda vendedores da garapa que utilizam gasolina para mover o motor da máquina que mói a cana. Eles informam que esse combustível confere mais mobilidade do que a energia elétrica e dizem desconhecer a possibilidade de geração de energia pelo bagaço da cana. Mas por que as prefeituras ou mesmo ONGs não lançam um programa para coletar esse bagaço rejeitado pelos garapeiros e encaminhá-lo para a produção de energia elétrica???

No que diz respeito aos efeitos das queimadas, são citados problemas respiratórios, sobretudo em crianças. Para Cortez, a queima da cana não é um problema ambiental muito grave. Ele cita trabalhos científicos que relatam o aumento das doenças respiratórias nos meses de inverno, nas regiões de colheita de cana, mas diz que gostaria de observar possíveis mudanças após o fim das queimadas, para então poder estabelecer uma relação entre causa e efeito.

Como lembra o apresentador Max Fercondini, "no fim das contas, há sempre um custo a pagar pela geração de energia, seja ele na forma ambiental, social ou econômica". Haveria custos que poderíamos pagar continuamente, sem comprometer a sustentabilidade?


sexta-feira, 5 de abril de 2013

Mais máquinas, menos produtividade?

No dia 3 de abril o jornal Valor Econômico publicou três matérias sobre um tema muito controverso envolvendo os aspectos social e econômico da sustentabilidade do bioetanol. Novas relações de trabalho nos canaviais e redução da produtividade foram destacadas como fruto da mecanização das lavouras. Os títulos das matérias são "Mecanização avança, mas cana perde produtividade", "Cortador de cana sobrevive à mecanização" e "Com máquinas, diminui rendimentos de canaviais".

Faço aqui um breve balanço da discussão no contexto das controvérsias.

Situação:

  • Aumento da área de plantio de cana-de-açúcar (7 milhões de hectares no Centro-Sul na safra 2012/13; em 2000, 3,8 milhões de hectares)
  • Aumento da mecanização (colheita 85% mecanizada, no Centro-Sul; em 2000, a colheita era 25% mecanizada)
  • Com a mecanização, produtores com décadas de experiência no setor têm que "reaprender" o manejo da cultura 
  • Uma colheitadeira de cana substitui de 80 a 100 trabalhadores
  • No início da década passada, a colheita manual de cana chegou a demandar 750 mil pessoas em todo o país, 500 mil no Centro-Sul
  • Em 2007, quando se intensificaram as pressões ambientais no Centro-Sul, o número de cortadores na região já havia recuado para 284 mil
  • No Nordeste, os canaviais estão em áreas mais montanhosas, a mecanização é ínfima e o quadro não mudou muito
  • O Nordeste é responsável por 10% da produção brasileira de cana e emprega cerca de 330 mil trabalhadores na atividade

Controvérsia social:

  • A maior parte da mão-de-obra liberada pelo setor, não qualificada, foi absorvida pela construção civil (José Giacomo Baccarin, professor do departamento de Economia Rural da Unesp de Jaboticabal/SP)
  • Dos 80 mil cortadores que as 190 associadas da UNICA empregavam em 2007, 22,7 mil foram qualificados para novas tarefas, principalmente na própria indústria da cana, como operadores de máquinas, mecânicos etc. (UNICA - representante das usinas do Centro-Sul)
  • Mesmo em unidades com colheita e plantio 100% mecanizados, há atividades de campo que justificam a manutenção de trabalhadores (carpir o mato, limpar a terra e abrir fileiras de cana que serão colhidas em seguida pelas máquinas, colher cana plantada nas curvas onde a máquina não alcança)
  • Ainda há usinas e fornecedores de cana que não assinaram o protocolo agroambiental que antecipa o fim das queimadas para 2014 (a lei determina o prazo de 2017 para eliminação das queimadas em áreas mecanizáveis). Elas ateiam fogo nos canaviais, e contratam mais cortadores.

Controvérsia econômica:

  • As usinas e fornecedores de cana investiram R$ 14 bilhões para mecanizar a colheita nos últimos cinco anos
  • A produtividade dos canaviais caiu de 85 para 70 ton/ha nos últimos três a quatro anos, sendo 8 a 10 ton/ha em razão da mecanização e a diferença, efeito do clima (João Guilherme Iglézias, diretor da Agroterenas, uma das maiores fornecedoras de cana para usinas) 
  • Quando uma máquina de colher cana (com peso de 20 toneladas e custo médio de R$ 900 mil) quebra, a usina deixa de colher 500 toneladas de cana por dia 
  • Agora surgem variedades de cana mais adaptadas às máquinas (as que "ficam mais em pé" e brotam melhor sob a palha) (João Guilherme Iglézias)
  • o setor testa técnicas para reduzir a compactação do solo provocada pelas máquinas e reduzir as impurezas trazidas pela colheitadeira para dentro da usina
  • Os fornecedores de menor porte estão descapitalizados para investir em máquinas
  • A concentração de açúcar na cana (ATR - Açúcar Total Recuperável) caiu nos últimos anos na região com as melhores condições de clima e solo para a cultura (Ribeirão Preto, Sertãozinho etc). Na safra 2012/13, a concentração de ATR caiu a 138 kg/ton, sendo que o desempenho médio do ATR na região era de 145 kg/ton, com picos até acima de 160 kg/ton. (Luiz Carlos Tasso Júnior, produtor e diretor da Canaoeste, associação que representa 2,8 mil fornecedores de cana em 80 municípios)
  • Retomar os níveis históricos só seria possível com um avanço significativo na genética da planta (Luiz Carlos Tasso Júnior) 

Ao que parece, em termos econômicos, a mecanização teve impactos negativos no presente e deverá se justificar a partir dos desenvolvimentos tecnológicos em curso para aumentar a produtividade no futuro. Em termos sociais, o desemprego resultante da mecanização teria contado com atenuantes importantes, como a absorção de trabalhadores (os mais qualificados) para outras funções nas usinas e as contratações (dos menos qualificados) pelo setor de construção civil. Nesse ponto, vejo como fundamental o papel da educação na qualificação dos trabalhadores, e a necessidade de uma economia fortalecida para abrir novos postos de trabalho. É aí que as controvérsias do bioetanol têm efeitos sobre o público em geral, incluindo você e eu.

terça-feira, 2 de abril de 2013

Cinzas de cana para fazer concreto

O Correio do Estado (Campo Grande/MS) publicou em 30 de março notícia sobre o aproveitamento das cinzas de caldeira resultantes da queima de bagaço de cana-de-açúcar nas usinas para fazer o chamado microconcreto, a ser empregado na construção civil.

A tecnologia foi desenvolvida em um projeto coordenado pela professora Maria Aparecida Garcia Tommaselli, da Universidade da Grande Dourados (UFGD), e pelos professores Antônio Zanfolim e Aguinaldo Alves Lenine, da Universidade de Mato Grosso do Sul (UFMS). O trabalho ganhou o Prêmio Odebrecht para o Desenvolvimento Sustentável em 2012.

Seguem trechos selecionados da matéria:
"A pesquisa (...) avaliou a resistência à compressão do microconcreto e também sua durabilidade quando submetido a ambiente agressivo, testando a proteção dele ao aço em seu interior. Outros testes estão sendo realizados, para estimar a durabilidade de uma estrutura construída com esse material." 
"Os resultados iniciais da utilização da cinza mostraram que o novo concreto apresenta maior resistência mecânica, comparado ao concreto convencional. É uma tecnologia vantajosa para o setor de construção civil, que atenderia também as agroindústrias de cana, que poderão dar uma destinação correta para as cinzas das caldeiras. 
Esta inovação vem reduzir o consumo de areia na construção civil que tem um forte impacto ambiental, pois altera a paisagem natural e pode afetar especialmente rios e bacias hidrográficas inteiras."
Assim, caso essa nova tecnologia se afirme e se dissemine, deverá ocorrer uma redução dos impactos ambientais tanto causados pelo setor ligado à cana como pelo setor da construção civil. Resta saber se realmente vingará.

segunda-feira, 1 de abril de 2013

Queimadas nos canaviais

No dia 22 de abril ocorrerá uma audiência pública no STF sobre queimadas nos canaviais, por convocação do ministro do STF Luiz Fux. As queimadas estão entre os temas controversos envolvendo o bioetanol no Brasil. Um resumo do evento:

  • Expositores (ou atores da controvérsia): serão 25 expositores representando produtores de cana, usineiros do setor sucroenergético, autoridades da área de saúde e meio-ambiente, e o poder público. Comparecerão entidades como a Agência Nacional de Águas (ANA), a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), o Ministério do Meio Ambiente, o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, a Associação Brasileira de Entidades Estaduais do Meio Ambiente (Abema), o Centro de Tecnologia Canavieira S/A (CTC) e a Federação dos Plantadores de Cana do Brasil (Feplana). Cada um terá 10 minutos para palestrar. 
  • Razão: um recurso do governo paulista contra lei do município de Paulínia que proíbe as queimadas para a colheita da cana.
  • Posições: o Estado, apoiado pelo Sifaesp (Sindicado da Indústria da Fabricação do Álcool do Estado de São Paulo), diz que a proibição das queimadas prejudica a colheita da cana e contraria a Constituição Estadual. A Câmara Municipal de Paulínia argumenta que a prática de queimadas prejudica a economia local, o meio ambiente e a saúde da população e dos trabalhadores rurais.

Segundo notícia do STF publicada em 26 de março, "ao convocar a audiência pública, o ministro Luiz Fux sustentou que a questão ultrapassa os limites jurídicos, demandando uma abordagem técnica e interdisciplinar. A finalidade das exposições será abordar questões ambientais, políticas, econômicas e sociais relativas à proibição do uso da queimada como processo de colheita da cana-de-açúcar".

O STF noticiou a audiência já em novembro do ano passado. “O escopo da audiência é esclarecer, pela participação de especialistas (grifo meu), as inúmeras questões ambientais, políticas, econômicas e sociais relativas à proibição da técnica de colheita da cana-de-açúcar por meio de queimadas”, afirmou o relator no despacho que convocou a audiência.

Ainda sobre o tema das queimadas, a revista Pesquisa FAPESP publicou em 25 de março a matéria "Mecanização da colheita de cana diminui emissão de gases de efeito estufa na atmosfera".